Pego, totalmente ao calhas, numa fotografia de entre as muitas que tinha guardadas dentro de uma velha caixa de sapatos, enfeitada com desenhos que nela colei há anos já esquecidos. As fotografias ainda estão em bom estado, volta e meia vou lá mexer-lhes, como para ter a certeza que as memorias estão no sitio e não se tratou tudo de mais um dos meus estranhos e complexos sonhos.
A caixa, essa foi perdendo a cor com os anos e o sol. Parece-se comigo.
Trata-se de uma fotografia tirada numa visita de estudo qualquer - não estamos de uniforme - na qual devo ter cerca de 16 anos. Encontro-me entre alguns amigos (era essa a palavra?) e colegas (desta lembro-me bem). Suavemente aproximo a chama de tamanho médio do isqueiro ás extremidades da foto e observo como escurece e se dobra. A mesma foto, mas de contornos tão diferentes. É quase irónico, o poder de tão pequena chama, mas não estou para me debruçar sobre ironias ou filosofias. Estou apenas a queimar fotos. Não é nenhum ritual espiritual, não estou a fugir ao passado nem a tentar limpar a minha alma. Estou simplesmente a queimar fotos, como uma qualquer actriz de filme lamechas. Até as lágrimas ameaçam aparecer, de forma a melhor enganar o público.
O que fazer com estas cinzas? Não se pode dizer que cheirem muito bem, e estão para aqui a sujar-me o chão. Queimei a foto, já não a queria mais, mas parece que ainda vou ter de me ocupar do que resta dela. Que dores de cabeça que nos dão até as coisas que já se foram! Talvez faça bem ás plantas, já ouvi dizer isso das cinzas. Será que as cinzas de uma velha foto poderão ajudar algo a crescer? Parece-me estranho, mas daí a ciência e a vida e tudo isso são, em geral, estranhas.
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